A internet tem possibilitado não só o surgimento de novas autoras, como a volta de outras que, por diversas questões, precisaram dar um tempo na carreira. Roberta Cirne é uma dessas que ressurgiram graças às redes sociais. E voltou aterrorizando com a série Sombras do Recife, quadrinhos sobre as assombrações e lendas da cidade, já sucesso no mundo virtual. Conversamos com a autora e desenhista sobre o seu processo criativo. Confere:
Como você começou a trabalhar com quadrinhos?
Eu trabalho com HQs desde a infância. Criei alguns personagens com uma amiga, e a gente desenhava só para amigos, parentes etc. Com o tempo, virou uma parceria de trabalhos que nos renderam algumas publicações, como “Passos Perdidos, Historia Desenhada “ (quatro volumes, prêmio HQMIX 2007 de contribuição), Heróis da Restauração e, por último, Afro Hq, contando a história do continente Africano do ponto de vista dos Orixás .
Parei por um tempo com as HQs por questões pessoais, mas não consegui me afastar de todo, e estou voltando agora com este projeto, o primeiro totalmente autoral, roteirizado e desenhado por mim.
Passos Perdidos, Prêmio HqMix 2007 de contribuição |
Como é seu processo criativo? Você tem uma rotina de criação? Tem metas? Como fazer pra chegar da ideia ao papel?
Bem, todo dia para mim tem uma rotina doméstica (sou casada, com dois filhos, um adolescente e uma garota), e algumas metas a cumprir. Quando já tenho uma HQ pronta, no lápis, a rotina é artefinalizar, ou pintar na aquarela, ou pintar digital e balonizar. Eu trabalho atualmente só, então todo o processo criativo, desde a idealização do que vai entrar no site, a criação do site e conteúdo e divulgação, é feito por mim, unicamente. Para isso, organizo meu tempo em blocos e tento não perder o foco.
Bem, todo dia para mim tem uma rotina doméstica (sou casada, com dois filhos, um adolescente e uma garota), e algumas metas a cumprir. Quando já tenho uma HQ pronta, no lápis, a rotina é artefinalizar, ou pintar na aquarela, ou pintar digital e balonizar. Eu trabalho atualmente só, então todo o processo criativo, desde a idealização do que vai entrar no site, a criação do site e conteúdo e divulgação, é feito por mim, unicamente. Para isso, organizo meu tempo em blocos e tento não perder o foco.
Quais temas gosta de abordar?
Sempre gostei muito da temática de horror, desde criança, e já escrevia contos de suspense com nove anos. Terror sempre foi a minha área. História da cidade e terror foram escolhas naturais, e poder apresentar e representar graficamente a cidade nesta forma é algo que sempre tive em mente, contar coisas que muitos recifenses desconhecem, passando pelas ruas, pontes, praças, sem desconfiar de toda a história que elas carregam. Não é apenas as assombrações e o susto pelo susto, é incorporar o medo ao ambiente da cidade, mostrando em cenários ruas que não mais existem, costumes que entraram em desuso.
Quais suas principais referências? O que te inspira?
Como tanta gente, minha paixão por quadrinhos nasceu do fato de que sempre li muito, e quadrinhos principalmente. Quando criança, adorava Luluzinha, Bolinha, Almanaques Disney (principalmente as HQs de Carl Barks, as ambientações da família pato na Escócia, Klondike, etc., que me instigaram o lado curioso e aventureiro). Minha mãe também sempre me incentivou a ler clássicos da literatura ao longo dos anos, e com certeza me auxiliou a criar roteiros, aliados aos desenhos.
Adoro literatura, e leio desde os mais modernos até os clássicos. Assim varia bastante: Na literatura é Edgar Alan Poe, Stephen King (de quem já li praticamente tudo), Tolkien, JRR Martin, Anne Rice (li toda a obra dela) alguns contos de Hitchcock, e outros. Nos quadrinhos, Neil Gaiman e Alan Moore, que norteiam minha ambição de qualidade. Gosto das obras de Garcia, nos super-heróis, Alcatena, E a série Camelot 3000 do Brian Bolland, além do arco do Inferno dos X-Men (aliás, tudo que foi escrito por Claremont). No cinema e séries, recentemente me empolguei com “A Colina Escarlate”, e nas séries, Breaking Bad, Penny Dreadfull, Grimm, Sleepy Hollow entre outras.
Como tanta gente, minha paixão por quadrinhos nasceu do fato de que sempre li muito, e quadrinhos principalmente. Quando criança, adorava Luluzinha, Bolinha, Almanaques Disney (principalmente as HQs de Carl Barks, as ambientações da família pato na Escócia, Klondike, etc., que me instigaram o lado curioso e aventureiro). Minha mãe também sempre me incentivou a ler clássicos da literatura ao longo dos anos, e com certeza me auxiliou a criar roteiros, aliados aos desenhos.
Adoro literatura, e leio desde os mais modernos até os clássicos. Assim varia bastante: Na literatura é Edgar Alan Poe, Stephen King (de quem já li praticamente tudo), Tolkien, JRR Martin, Anne Rice (li toda a obra dela) alguns contos de Hitchcock, e outros. Nos quadrinhos, Neil Gaiman e Alan Moore, que norteiam minha ambição de qualidade. Gosto das obras de Garcia, nos super-heróis, Alcatena, E a série Camelot 3000 do Brian Bolland, além do arco do Inferno dos X-Men (aliás, tudo que foi escrito por Claremont). No cinema e séries, recentemente me empolguei com “A Colina Escarlate”, e nas séries, Breaking Bad, Penny Dreadfull, Grimm, Sleepy Hollow entre outras.
Você faz alguma pesquisa para suas histórias?
Com toda a certeza! Para evitar contradições ou erros, sempre pesquiso a respeito dos assuntos a serem tratados. É uma questão de qualidade e respeito à cultura e práticas dos povos ou temas utilizados.
A pesquisa que estou trazendo com as HQs de Sombras do Recife já existe há 19 anos, porém nunca consegui publicar pelos meios tradicionais. Trabalhei em Passos Perdidos, Afro Hq e Heróis da Restauração em parceria com roteirista e historiador, então basicamente eu fiz a parte gráfica das hqs.
As HQs de Sombras do Recife estão roteirizadas e desenhadas por mim, então estou cuidando de toda a parte literária, histórica e de design. Demora cerca de dois meses para transformar o roteiro já existente em rascunhos, fazer a pesquisa de vestuário, móveis e ruas (basicamente pegando ruas que não mais existem, resgatando para a topografia da cidade atual, etc). Desenho, arte final, balonagem. Todo o site é criado, mantido e organizado apenas por mim, que ainda cuido da parte de design e CEO. Temos, na época atual, de saber lidar com tudo, e eu sou bastante curiosa para pesquisar e criar em tudo o que busco.
Neste momento do projeto, estou narrando como cada monstro surge, em suas distintas épocas: Boca de ouro, em 1913; A Velha Branca e o Bode Vermelho, 1885; Branca Dias, em 1598; Papa Figo, em meados de 1850, e por assim em diante. Cada um terá sua história ambientada no Recife das épocas, com os usos e costumes, roupas, ruas, etc. É uma pesquisa feita em mais de 100 fontes literárias, e não apenas um livro e adaptação. Quero recriar o passado. Tenho na bibliografia diversos autores, sociólogos, folcloristas e suas diversas obras, tais como Câmara cascudo, Gilberto Freyre, Mário Sette, Pereira da Costa, Antônio Gonsalves de Mello, e suas caracterizações sociológicas, alguns com obras esgotadas nas livrarias da cidade, mas que tive acesso por sebos, bibliotecas públicas, arquivos escritos, etc.
O que eu quero adicionar à ideia dos quadrinhos é a presença de textos adicionais, ou glosas, que podem ser lidos juntos ou em separado, mas que aprofundam a experiência da HQ. Estes textos serão paradidáticos, e contarão a história da cidade, de acordo com a pesquisa feita sobre a obra destes mestres sociólogos e antropólogos, estudiosos do folclore e da história de Recife.
Roberta Cirne arte-finalizando |
O que faz quando tem o famoso branco?
Atualmente o bichinho está dando um tempo, mas quando acontece, vou fazer algo diferente, jogar um joguinho no celular, ver um filme interessante. Às vezes ler um pouco, ver um filme termina dando um novo boost de ideias, que acaba com o branco.
Atualmente o bichinho está dando um tempo, mas quando acontece, vou fazer algo diferente, jogar um joguinho no celular, ver um filme interessante. Às vezes ler um pouco, ver um filme termina dando um novo boost de ideias, que acaba com o branco.
Qual a importância das personagens para as histórias? Qual seu trabalho de desenvolvimento de personagens?
Cada personagem é como um ser vivo, ele tem de passar esta impressão. Desde o começo, sempre crio os personagens um pouco no estilo do quadrinho japonês: quem ele é, o que gosta de comer, que roupa compraria no shopping, uma frase ou mote, objetos característicos ou tiques nervosos, alergias , signos, etc.
Sou fascinada com os anti-heróis, a jornada tortuosa e suas quedas ou ascensão, dependendo do caso. Gosto de dar densidade a cada um deles. Por exemplo, o Boca de Ouro da HQ está sempre com o cigarro apagado, ele esquece os fósforos desde o começo da HQ, o que justifica a assombração, que sempre aparece pedindo fogo para o cigarro. O cigarro apagado também reflete ações “do bem” que ele faz. Quando ele se decide a matar para conseguir a mulher amada, é a única cena em que o cigarro dele aparece aceso. Assim, vou moldando cada um dos personagens abordados, pelo menos os principais.
Estou escrevendo, em paralelo, um livro baseado na mitologia folclórica, onde estes personagens se cruzam. Dá para ler a HQ e encontrar Valdemar, o Boca de Ouro lá.
Boca de Ouro |
Qual a importância do quadro em uma história em quadrinhos?
O quadro tem de complementar o que o texto não consegue definir, e vice versa. É uma simbiose dos dois.
Quais são os cuidados na hora de diagramar uma página?
Primeiro foco no roteiro e a partir daí, uma thumb de meio A4. Passo para o A4 em um rascunho para definir as áreas mortas e aí pesquisa de vestuário e cenários (móveis, ruas, etc de acordo com a época).
Como chegar até o público? Como estabelecer uma relação com o leitor?
O respeito ao leitor é o primordial. Sempre ter tempo para ele, sem arrogância, porque no fim das contas, ele é o espelho que reflete o que você faz. Sem o leitor, o escritor/autor não é quase nada. Então, sempre procuro responder a todos, e tratar exatamente como eu gostaria de ser tratada. Com gentileza e atenção.
Passos Perdidos |
Você consegue viver de quadrinhos?
Para ser sincera, apenas quando aparece um projeto cultural, por alguma prefeitura. Tenho meios de renda própria, posso me dedicar e bancar o site e hospedagem. Dá para viver com minha renda, complementando com projetos por fora. Mas, sem ter nenhuma publicação atual, revista física, não dá para viver com o site ainda.
Quais as dificuldades do mercado brasileiro?
Tanto a situação político-financeira, quanto ainda uma falta de interesse no quadrinho autoral. Eu estou apostando bastante na internet, pois as publicações físicas tem um limite, que não se aplica na net. Ainda vamos encontrar uma forma realmente rentável de vender o quadrinho digital, em um futuro próximo.
O que te motiva a continuar fazendo quadrinhos?
Minha motivação é interna, principalmente. Passei muitos anos desenhando apenas projetos que, davam um certo prazer, mas não eram a minha alma. O que estou fazendo no momento, no Sombras do Recife é o que sempre sonhei fazer. É difícil, desgastante, às vezes dá desânimo. Mas a cada reação do público, e vendo que estou formando uma fanbase que acredita e curte a ideia, me empolga. Ainda não sei o potencial todo do trabalho, estou descobrindo dia a dia. Em menos de três meses, nosso site atingiu 12.000 visitas, e vai crescendo dia a dia.
Com toda a dificuldade, faça. Mesmo um pouco a cada dia. Ao voltar do trabalho, dedique uma hora depois do jantar, que seja. Vá construindo seu sonho, um pouco de cada vez.
O que aconselharia para quem está começando ou quer trabalhar com quadrinhos?
Sei que às vezes o mercado parece desanimador, mas precisamos entender que só temos uma vida, e cada dia do nosso presente é exatamente isso, um presente. Não sabemos o quanto vamos estar aqui neste mundo, e é muito importante que, ao final da vida, não fique na lembrança o que deixamos de fazer.
Com toda a dificuldade, faça. Mesmo um pouco a cada dia. Ao voltar do trabalho, dedique uma hora depois do jantar, que seja. Vá construindo seu sonho, um pouco de cada vez. Nunca desista deles, para não haver arrependimentos no futuro. A força está dentro de você (momento star wars), e você consegue tudo, acreditando nisso.
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