O sucesso de MSP 50 e o grande burburinho que MSP +50 vem gerando na internet levantam algumas perguntas. Por que Maurício de Sousa ainda reluta em creditar seus quadrinhos? Não seria o momento de dar mais liberdade a seus artistas?
Geralmente, quando o gibi ou o personagem faz muito sucesso, o artista contrata uma equipe para ajudar a vencer a demanda. Outros roteiristas e desenhistas fazem os quadrinhos supervisionados pelo criador. Surge aí o grande problema, muitas vezes essas pessoas não levam créditos por seu trabalho. São os chamados “fantasmas”. “Essas histórias em gibis (cujos royalties pertenciam à editora) eram iniciadas por um escritor e um desenhista, em geral, para, posteriormente, se desdobrar em mil e um desenhistas fantasmas, que mal conseguiam assinar a história” afirma Álvaro de Moya (1977, p. 65). Ele aponta questões trabalhistas como uma das razões desse sistema: “Os editores de comic books procuravam fugir à luta patrão vs. empregado que se notava nas histórias publicadas em jornais pelos syndicates (distribuidores), cujos criadores tinham força demais como autores.”
Os quadrinhos da Disney, por décadas, foram todos assinados por Walt Disney, mesmo sendo produzidos em vários países. Walt mesmo, nunca se envolveu com os quadrinhos. Ele, na verdade, não era grande desenhista. Nem mesmo a famosa assinatura dos estúdios era dele. Eliot (1995, p. 120) afirma que Disney fizera um de seus artistas (...) criar um logotipo para a companhia baseado em sua assinatura, uma versão mais charmosa de sua verdadeira assinatura. Tinha muito orgulho dela e, quando solicitado a realmente assiná-la, sempre transformava em grande produção o que, na verdade, não passava de uma bem treinada cópia de uma cópia. Álvaro de Moya (1987) no prefácio do livro Para Ler o Pato Donald comenta que “O resto, tal como Rubens e Salvador Dali, foi trabalho de uma enorme legião de fantasmas (ghosts) aqui espalhada pelo mundo todo. Legião da qual o signatário deste prefácio fez parte, em 1950, nos inícios da
Editora Abril em São Paulo, Brasil, desenhando as capas de Pato Donald e Mickey. E assinando “Walt Disney”, impossibilitado de assinar minhas próprias histórias em quadrinhos, até desistir para sempre do desenho.”
“Walt tratava seus animadores (...) como empregados, mais que artistas. Permaneciam em sua maioria anônimos (...)” explica Eliot (1995, p. 98). Alguns artistas burlavam essa dinâmica. É o caso de Renato Canini. A introdução da revista Mestres Disney n° 5 conta que “É possível ver nos cenários estabelecimentos como “Cantina Canini”, “Loteca Canini” e outros. Mas sua marca registrada, porém, é um pequeno caramujo escondido no canto de algum quadrinho”. Nem mesmo os principais personagens Disney foram criados por Walt. Moya (1996, p. 125) explica que “Ao montar seus próprios estúdios, apareceu Mickey Mouse, a Walt Disney cartoon, drawn by Ub Iwerks. Esse Ub Iwerks era um membro da equipe e o verdadeiro desenhista do famoso camundongo”. Tio Patinhas, Irmãos Metralha, Professor Pardal, Maga Patalójika e Patópolis, entre outros, são criações de Carl Barks. Moya (1987) é taxativo: “Disney criou, portanto, apenas Alice e o coelho Osvaldo”.
Walt Disney precisou deixar de desenhar quando seu estúdio começou a ficar grande. Ele passou, então, a só organizar os trabalhos e supervisionar sua equipe. Walt relata (apud Eliot, 1995, p. 63): “Então, quando Mickey surgiu, causando grande sensação, foi preciso que eu desistisse de desenhar para poder organizar e administrar a empresa. (...) Ele significou a minha dispensa da produção.”
A falta de créditos nos quadrinhos Disney era motivo de chacota em revistas de humor estadunidenses. Moya (1977, p.76) relata que Vítimas constantes dos ataques de Mad eram Walt Disney, que sempre surgia como Walt Dizzy (Tonto), e suas milhões de assinaturas espalhadas pelo mundo todo, em crítica ao exército internacional de ghosts (fantasmas) que redesenhavam seus personagens.
MAD Magazine #2
Diferenças de estilo, tanto de enredo como de desenho, são bastante perceptíveis nas histórias em quadrinhos da Disney. Esses diferentes estilos foram criando fãs, que buscavam saber quem realmente estava por trás deles. O grande responsável por esse movimento foi Malcom Willits, fã de Carl Barks, que descobriu a identidade do artista na década de sessenta. “Suas criações obtiveram um sucesso tão retumbante que os admiradores acabaram tirando-o da obscura situação a que Disney obrigava seus auxiliares” comenta Moya (1996, p. 125). E continua (1996, p. 126): “Finalmente, da legião de fantasmas de Disney no mundo todo, um alcançava a notoriedade, surgindo da bruma do exército silencioso e invisível da imensa produção dos trabalhos Disney.”
Hoje, revistas Disney já vêm com os créditos devidamente incluídos. Também são lançados álbuns e edições especiais com histórias de somente um autor. Alguns artistas já são reconhecidos como Mestres Disney, entre eles Carl Barks, Don Rosa, Cavazzano, Gottfredson, Romano Scarpa e no Brasil, Renato Canini.
Maurício de Sousa ainda assina todas as histórias da Turma da Mônica. Os nomes dos roteiristas e desenhistas do estúdio são citados na última página de cada revista, porém sem indicação de qual história exatamente aquele artista fez. Maurício de Sousa aparece apenas como redator. As únicas histórias totalmente produzidas por ele são as do dinossauro Horácio. “É o único personagem que, até hoje, só eu desenho. Todas as histórias dele são criadas e desenhadas por mim. Mais ninguém mexe.” afirma Maurício em entrevista ao site Side Effects. O resto dos gibis da Turma da Mônica quase não tem sua participação. Para a página Beco das Imagens, o quadrinista comenta:” hoje tenho uma equipa, e eles trabalham tão bem que eu só preciso de dar algumas orientações. O resto praticamente já não preciso de ver. E se houver alguma falha, alguma coisa errada, eu vejo na versão publicada e aviso logo o responsável. (sic)”
A criação de personagens ainda fica por conta de Maurício de Sousa. Para a página Side Effects, ele fala sobre o asunto: ”Há dois personagens na Turma da Mônica que não são criações minhas. O Louco e o Bugu, aquele cachorrinho amarelo que aparece nas histórias do Bidu. São do meu irmão, Márcio, da época em que era um dos roteiristas das histórias.”
Nas histórias em quadrinhos da Turma da Mônica são perceptíveis algumas diferenças entre os estilos de roteiros, porém os desenhos seguem um padrão bem rígido. Em entrevista para o Universo HQ, Renato Canini afirma: “É péssimo se "despersonalizar". Desenhar personagens dos outros é horrível. Parece que os
desenhistas do Mauricio de Sousa superaram essa fase. Como temos que "pagar o leite das crianças" que morra o "EU". Help!”
Maurício de Sousa, assim como os syndicates estadunidenses, tem como desculpa os copyrights e os direitos trabalhistas para impedir que sua equipe assine suas revistas. Ele (2003) deixa isso bem claro em uma entrevista para a página Universo HQ: “Eu não farei isso e posso dar uma razão muito simples: copyright. Um artista tendo seu nome na frente de um personagem pode, mais tarde, reclamar algum tipo de direitos sobre ele. Claro que perderá na justiça, mas é algo que não há necessidade no meu pessoal. Assim, nas minhas revistas isso não acontecerá.” Na mesma entrevista ele pega um gibi e mostra a ultima página tentando amenizar o problema: “Os nomes estão todos lá. Essa questão dos créditos não é problema, pelo menos no meu estúdio.”
Deixar cada artista assinar sua própria história não é somente uma maneira de valorizar o trabalho dele. “É uma forma de cativar o leitor (e um marketing barato), que passa a se identificar com determinado artista, a formar fãs-clubes e a ter uma relação mais pessoal com as revistas e histórias.” afirma Santos (2003). E não só. A divulgação do nome dos artistas da Turma da Mônica ajudaria todo o mercado de quadrinhos nacional. No momento em que os leitores virassem fãs de determinado roteirista ou desenhista, ele poderia ir atrás de seu próprio mercado, lançar suas próprias revistas, ancorado por seus seguidores. E Maurício de Sousa não perderia nada, nem respeito, nem mercado. Portanto, Maurício, esperando o que para dar este importante passo?
Referências bibliográficas:
CANINI, Renato. [Entrevista disponibilizada em 2001, a Internet]. Disponível em:
nov. 2007.
DORFMAN, Ariel e MATTELART, Armand. Para Ler o Pato Donald: Comunicação
de Massa e Colonialismo. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1980.
ELIOT, Marc. Walt Disney: o príncipe sombrio de Hollywood. São Paulo: Marco
Zero, 1995.
MOYA, Álvaro de. História da História em Quadrinhos. São Paulo: Brasiliense,
1996.
MOYA, Álvaro de. Shazam!. São Paulo: Perspectiva, 1977.
SOUSA, Mauricio de. [Entrevista, a Internet]. Disponível em:
SOUSA, Mauricio de. [Entrevista disponibilizada em 19 de outubro de 2003, a
Internet]. Disponível em:
Acesso em: 5 dez. 2007.
SOUSA, Mauricio de. [Entrevista 2003, a Internet]. Disponível em:
html>. Acesso em: 4 dez. 2007.
Péssimo, pura inveja.
ResponderExcluirClaro que é inveja. O Mestre Renato Canini também devia ser um invejoso, rs
ExcluirUma coisa legal nas revistas dos grandes herois Marvel e DC é esse reconhecimento pelos desenhistas, roteiristas e até letristas. Os quadrinhos não são assinados por Joe Quesada ou Stan Lee. Realmente, temos uma identificação maior com as revistas, conforme o artista que a concebe.
ResponderExcluirA desculpa de Maurício de Sousa pra não creditar seus artistas é ridícula! Nunca um personagem deixaria de ser seu só por que outro desenhista está à frente das histórias! Pelas leis autorais, a criação sempre será do criador. Simplesmente, a velha história de querer aparecer mais que os outros. Todo mundo sabe que Mauricio de Sousa só desenha as histórias do Horácio, e olhe lá. Desculpinha mal dada!
Um dia, quando tiver meu próprio estúdio (hehehe), pretendo creditar meus desenhistas. Não tem cabimento querer todos os créditos por algo que você não fez...
Abraços o/
achei um topico muito desnecessario. Por muitas vezes, os integrantes do estudio sao incluidos nas historinhas, mostrando aos leitores que as historinhas sao, obviamente, fruto de uma equipe.
ResponderExcluirFaço das palavras dele as minhas
ResponderExcluirBispo:
achei um topico muito desnecessario. Por muitas vezes, os integrantes do estudio sao incluidos nas historinhas, mostrando aos leitores que as historinhas sao, obviamente, fruto de uma equipe.
achei um topico muito desnecessario. Por muitas vezes, os integrantes do estudio sao incluidos nas historinhas, mostrando aos leitores que as historinhas sao, obviamente, fruto de uma equipe.
ResponderExcluirNa verdade Walt escreveu as primeiras tiras do Mickey, desenhadas por Ub Iwerks. É um erro afirmar que ele nunca esteve envolvido com os quadrinhos. Walt também insistiu para que os créditos dos próprios autores fossem publicados nas tiras mas foi a King Features quem bateu o pé e não aceitou fazer isso. Se contextualizarmos que isto occoreu em 1930 é evidente que a King era MUITO mais forte do que a Disney naquele momento. Foi TAMBÉM idéia do Walt que o Mickey tentasse suicídio em uma série de tiras do Mickey desenhadas por Floyd Gottfredson. Quanto ao Mauricio, o que ocorre é que os fãs de suas histórias são bananas imbecis e idiotas. Se eles tomassem a iniciativa semelhante a que nós, fãs de Disney, tomamos a dez anos atrás com o Inducks, algo poderia ser diferente hoje em dia:
ResponderExcluirhttp://www.inducks.blogspot.com/
Fernando, muito obrigado pelas informações. As que utilizei no artigo foram retiradas da bibliografia citada.
ResponderExcluirO Inducks é uma iniciativa mais do que louvável, trouxe a tona dezenas de nomes de ótimos artistas.
Uma pena que no Brasil se uma pessoa está ganhando, danem-se as outras que estão sendo exploradas. Pena mesmo, poderíamos conhecer mais artistas e saber quais são seus trabalhos, não apenas saber que as histórias são fruto de uma equipe (o que todos sabemos e não negamos).
abraço
Ótimo post, levantando uma questão importante. Tá mais do que na hora de o MAUrício valorizar mais ainda sua equipe.
ResponderExcluirO mais engraçado no entanto são os puxa-sacos vindo aqui falando que o assunto é "desnecessário" ou é "inveja" do articulista.
Bom, é claro que ser explorado nunca é bom. Mas o Maurício de Souza não acorrentou ninguém a uma prancheta e os forçou a desenhar. Os artístas aceitaram trabalhar pra ele, cedendo a mão de obra em troca de um valor... O que não tem cabimento é querer os louros da vitória por desenhar ou escrever em cima de um universo que outra pessoa criou, ainda mais quando essa pessoa é o dono do estúdio... Se quer que seu trabalho apareça, produza algo por conta própria e não queira fazer fama em cima da criação dos outros... Assunto polêmico, mas não vi exploração nenhuma, vi trabalho remunerado... Acho correto da parte do Maurício de manter as rédeas curtas, por que senão, todo mundo vai mecher até deturpar a imagem dos personagens colocando elementos diferentes por conta própria, como acontece com os personagens da Marvel/DC... Ou será que gostariamos de ver os nossos personagens preferidos todos modificados? Alterando inclusive a personalidade deles... Respeito a opinião de todos ai, mas temos que pensar um pouco diferente...
ResponderExcluirMe desculpe, mas não. Essa história de que ele não acorrentou ninguém é típica de dono de estúdio ou de alienado que reproduz esse discurso maléfico. O artista também tem família e precisa se sustentar, de modo que se faz necessário trabalhar em locais que não o agradam. Não vejo o motivo pelo qual Maurício não possa dar créditos a não ser ganância e egoismo. E, apesar das personagens terem sido inventadas pelo Maurício, quem atualmente as produz são os artistas contratados pelo estúdio. Caso contrário ele poderia fazer tudo sozinho, não?
ResponderExcluirE, sim, gostaria de ver as personagens de diferentes formas, diferentes modos de vista, ficar sempre na mesma coisa é muita preguiça mental, me desculpe!